terça-feira, 13 de novembro de 2012

Obrigado!

Nasceu naquele tempo ido, esquecido, pintado pelo cinzento dos dias amargos.
Roubaram-lhe o colo, negaram-lhe afecto e, antes de o ser tornou-se mulher.
Moveu-se pela vontade, pelo desejo, pelo amor que encontrou, dentro de si ou nos poucos olhos que lhe devolviam sorrisos.
Cresceu sem se dar conta de não ter vivido, por desconhecimento ou inocência, a sua "meninice".

A vida ofereceu-lhe uma rara inteligência, aguçada astúcia, talento e engenho que a fizeram maior, sobrevivente.

Crente, generosa, amada, convicta e determinada, trilhou o seu caminho, defendeu as suas verdades, lutou pelas suas conquistas, enfrentou todos os que lhe tentaram provar, tantas vezes, que o seu caminho estava errado aos olhos de Deus e dos homens.
Afirmou-se numa sociedade que corria no sentido oposto ao da sua direcção. Descansou como fizeram, sempre, os grandes guerreiros da história, sem nunca desistir.

A candura com que reagiu, a tudo quanto a vida lhe quis oferecer, ficou-lhe marcada nas rugas que percorrem o seu rosto, onde prevalece, até hoje, o sorriso ou a lágrima emocionada.

Guiou os seus destinos, e os daqueles a quem ama, com a mestria própria das velhas matriarcas.  Fiel a si, leal ao que teme, respeitou o outro, por coerência e verdade, por decoro, ou simplesmente... por respeito.

Foi abrigo, conforto, colo, verdade e voz de comando. Foi luz na escuridão, foi bússola no desnorte, foi cúmplice nas lágrimas de dor, anfitriã das maiores comemorações.

Construiu-se, definiu-se, caiu e ergueu-se de tantos e tão penosos desafios, e voltou a ensinar-nos uma e outra vez, como tantas vezes gosta de acreditar "que Deus não mande aquilo que o corpo aguenta".

Nem a longevidade comparada às suas quase nove décadas seriam suficientes para lhe agradecer, para lhe retribuir, o que o seu olhar, as suas mãos, o seu sorriso, o seu amor me têm ensinado.

Décadas de lucidez, aprendizagem, verticalidade e candura estonteante que me me fazem apaixonar sempre que a luz do seu sorriso me ilumina a vida, a alma, o corpo.... até hoje.

É de amores maiores que nos alimentamos, é do amor que ensinou, a quem mo ensinou a mim, que dependo. É lá que me refugio, é lá que está o que de mais precioso tenho.

Tenho guardadas todas as histórias, todas as lendas, todos os momentos que continuamos a partilhar com o mesmo interesse, a mesma intensidade, o mesmo amor, consciente do privilégio que é poder ter-te ao meu lado.

E ainda que todas as palavras, de todos os poetas, de todos os tempos, sejam insuficientes para te retribuir tanto, "gastarei" o simples OBRIGADO, por toda a minha vida...

sábado, 10 de novembro de 2012

Uma noite...


Busco na noite
o som das palavras
a voz dos poetas
refugio perdido
ode sem sentido
que me dás no ácido
da tua boca, que quero beijar.

Não quero mais
Não quero ir
Não quero sentir
Não quero ser…
Sai de mim.

Quero mais de ti
quero mais do que tu
quero-me a mim,
nua, tua, entregue
ao acaso, à sorte,
ao vento, à morte
que me fazes desejar

Quero brindar a este amor
que não sabes ler
não consegues ver
na minha pele a transpirar

Magoas, feres, matas
por entre as palavras que não controlas
no meio da multidão que te ocupa
e te faz perder
de ti, ou de mim,
da razão ou do que não sabes dizer

Não quero mais,
não posso mais,
mereço mais do que o copo
por que me trocas na solidão desse corpo
onde me tens vazia de razão
de amor, de ti e de nós…

quinta-feira, 8 de novembro de 2012

Saudades do futuro

Saudades do futuro esquecido, do rosto perdido, do caminho adiado, da vontade abandonada à sorte e ao vento.

Saudades do futuro construído de sólidas incertezas, de vãos momentos, de rostos, vontades, medos, desejos…

Saudades do condão que entrego à vida, tornando-me escravo dos seus caprichos, criado silencioso das suas vontades, espectador inerte em todos os palcos.

Saudades do futuro que se esgotou, por tê-lo vivido, sentido, concretizado.

Saudades desse desconhecido momento em que deposito tudo o que existe em mim, fora de mim, ao meu redor e me invade, como ar que inspiro e me faz sentir, sorrir, viver…

Não é o passado que me dói, não são as memórias que me revisitam, não são âncoras que me prendem.

Não é do presente que fujo, não é hoje que me aterroriza, não é este agora, ainda que cheio de nada, que me sufoca o grito na garganta.

Não é o desconhecido, nem o escuro, nem a ilusão, nem o medo…

Não é nada, senão o futuro!

O futuro de que me falam, e eu não escuto.
O futuro que sei existir, mas não vejo.
O futuro que creio, mas não sinto.
O futuro… nessa forma de saudade.